"Cidades inteligentes usam serviços ecossistêmicos para potencializar infraestrutura urbana", afirma André Ferretti, do Boticário

Gestão ambiental será crucial para o desenvolvimento e futuro econômico das cidades.

ANDRE FERRETIAndré Ferretti, da Fundação Grupo Boticário. (Foto: Divulgação)

De acordo com o mais recente relatório do Unicef e da Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 2,2 bilhões de pessoas não têm acesso a serviços de água potável gerenciados de forma segura e 4,2 bilhões não possuem serviços de esgotamento sanitário. Por isso, especialistas chamam a atenção para a importância de investimentos em Soluções Baseadas na Natureza (SbN) para garantir a segurança hídrica da população, especialmente em regiões metropolitanas. No Rio de Janeiro, por exemplo, investimentos em infraestrutura natural podem representar R$ 156 milhões em economia para os cofres públicos.

“Cidades inteligentes e baseadas na natureza usam serviços ecossistêmicos fornecidos pelo meio ambiente para complementar ou potencializar estruturas convencionais de infraestrutura urbana. Na gestão hídrica, uma das principais Soluções Baseadas na Natureza utilizada para aperfeiçoar o sistema de abastecimento é a restauração de cobertura vegetal em pontos estratégicos das bacias hidrográficas”, explica André Ferretti, responsável pela área de Economia da Biodiversidade da Fundação Grupo Boticário.

O estudo “Infraestrutura natural para água no Sistema Guandu, Rio de Janeiro” estima que a restauração florestal na bacia requer investimento de R$ 103 milhões em 14 anos. O cálculo considerou gastos como a compra, o transporte e o plantio das mudas, a preparação da área, a adubação, a mão de obra e cercamentos. Levou ainda em consideração despesas incorridas para identificar, sensibilizar e engajar proprietários de terras nos projetos de restauração.

Para Cecília Herzog, paisagista urbana, especialista em preservação ambiental das cidades e membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza (RECN), as SbN podem – e devem – estar distribuídas pelas áreas urbanizadas e ao longo de rodovias, de modo a evitar a circulação de contaminantes levados aos rios pelas chuvas.

“Essas soluções atendem a contextos específicos, podendo receber a água em diversas tipologias, tais como biovaletas ao longo de estradas, conectando jardins de chuva, canteiros pluviais, tetos verdes e alagados construídos. A própria estação de tratamento poderia ser atualizada para uma estação de águas com base na natureza, com jardins filtrantes nas imensas áreas que represam as águas do sistema Guandu”, avalia a especialista.

Operação de peso

No final de março, o diretor-presidente da Emae – Empresa Metropolitana de Águas e Energia, Marcio Rea, apresentou o resultado do trabalho realizado pela companhia nos dois primeiros anos do Programa “Novo Rio Pinheiros”, que prevê a despoluição e a revitalização do seu entorno até 2022.

Entre as ações realizadas pela Emae no âmbito do projeto iniciado em 2019 estão o desassoreamento de 240,5 mil metros cúbicos de materiais do rio, recorde dos últimos cinco anos; a retirada de 351,2 mil metros cúbicos de sedimentos em ações de desaterro, que visam aumentar o espaço das áreas chamadas “bota-fora” nas margens do rio; e a recuperação de taludes em trechos como nas proximidades dos córregos Morro do S e Pirajuçara.

A coleta de resíduos sólidos é outra importante contribuição da Emae para o projeto: entre 2019 e 2020, foram removidas mais de 20 mil toneladas de detritos, como garrafas pet, bicicletas, pneus, plásticos, entre outros. A manutenção dos 50 quilômetros das margens, com a roçagem de 6,7 milhões de metros quadrados de área nos últimos dois anos, também foi realizada pela empresa. “Graças ao apoio do secretário estadual de Infraestrutura e Meio Ambiente, Marcos Penido, e das empresas que fazem parte deste projeto, conseguimos chegar até aqui com bons resultados. Tudo é feito em conjunto”, afirma Marcio Rea.

sp_governo_cidade_vista_aerea_270320193512Gestão ambiental será crucial para o desenvolvimento econômico das cidades. (Foto: Divulgação)

Resíduos sólidos

Os temas relacionados à gestão de resíduos foram pouco discutidos nas eleições municipais de 2020. Para Carlos Silva Filho, presidente da Associação Internacional de Resíduos Sólidos (Iswa, em inglês) e diretor presidente da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), as atuais administrações municipais têm pela frente obrigações bem claras estabelecidas por leis federais, como a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), que completou 10 anos de vigência em 2020, e a mais recente Lei 14.026/20, que modernizou o marco legal do saneamento básico.

“Ambas trazem determinações para que sejam implementados diversos avanços na execução dos serviços de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos, começando com a distinção entre resíduos e rejeitos, importante para planejar o tipo de destinação adequada em cada realidade e com a indicação da ordem de prioridade de ações a serem observadas pelos gestores municipais, que devem atender, dentre outros, aos princípios fundamentais da universalização, respeito à saúde pública, conservação dos recursos naturais e proteção do meio ambiente”, explica Silva Filho.

O executivo ainda complementa que a relação de deveres dos gestores abrange o encerramento dos lixões e demais unidades de disposição inadequada, universalização da coleta regular e ampliação da coleta seletiva, elaboração dos Planos de Gestão de resíduos, instalação de infraestruturas para viabilizar a reciclagem, recuperação dos materiais descartados (secos e orgânicos) e a implantação de sistema de remuneração dos serviços de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos, de forma a assegurar sua sustentabilidade econômico-financeira. “Para que os avanços previstos tenham condições de serem implementados faz-se necessário contar com recursos suficientes para investimento em novas plantas e para seu custeio contínuo, visto que são serviços essenciais que não podem sofrer paralisação”, encerra Silva Filho.