Empresas familiares enfrentam desafios de governança e alinhamento entre sócios
Esses negócios, que fazem parte do segmento do middle market, consideram uma transação de M&A um evento estrutural e de grande relevância, mas geralmente não estão preparados para essa operação.
Rodrigo Maluf, sócio-líder de M&A na EY Brasil. (Foto: Divulgação)
As empresas familiares têm um impacto enorme na economia dos países. O índice deste ano dos 500 maiores negócios familiares globais, produzido pela EY em parceria com a universidade suíça de St. Gallen, demonstra que essas empresas registraram receitas agregadas de US$ 8,8 trilhões – aumento de 10% em relação a 2023. Sua contribuição, ainda segundo o índice, é relevante para o mercado de trabalho ao empregar 25,1 milhões de pessoas. Por fim, 47% dessas 500 maiores estiveram envolvidas em pelo menos uma transação de fusão e aquisição. Na visão do estudo que publica o índice, mesmo que o ambiente atual de negócios seja desafiador, as fusões e aquisições continuam no centro da estratégia de crescimento dos maiores negócios familiares do mundo, motivo pelo qual eles têm recorrido a essas operações.
A realidade de uma gestão profissional não é a regra para todos os negócios familiares, ainda que os maiores já tenham adotado essas práticas. “Ao trazer para a realidade brasileira, percebemos que as empresas familiares têm uma gestão muito concentrada nos donos, com esses sócios centralizando as decisões e com uma equipe júnior ou inexperiente abaixo deles. A qualidade das informações sobre o negócio é questionável por estar baseada muitas vezes nas percepções dos donos”, diz Thereza Frauches, M&A Senior Manager da EY Brasil. Pode haver, ainda segundo a executiva, uma visão distorcida dos sócios sobre o valor do negócio, ficando acima do valuation que será feito pelo mercado antes de concretizar a fusão ou aquisição. “Essa visão gerencial do negócio costuma ser mais otimista do que a diligência que será realizada antes da operação. A empresa pode, por exemplo, não gerar tanto caixa quanto os sócios acreditam”, completa.
Os potenciais compradores também farão ajustes no valor final do negócio caso haja necessidade de regularizá-lo. Situação comum é a constatação de que a empresa não tem seus colaboradores inseridos na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), embora devessem estar enquadrados nesse regime de trabalho. “Haverá necessidade de fazer esse ajuste para regularizar o pessoal, impactando assim no custo da força de trabalho, que deverá refletir no valuation da empresa. Afinal de contas, os potenciais compradores terão um custo para fazer essa regularização”, diz Thereza. “Costuma haver, portanto, dificuldade por parte dos sócios no entendimento do racional de valor de mercado da empresa. Também falta entendimento sobre os ajustes de valuation decorrentes de riscos, contingências e estrutura de capital”, finaliza a executiva.
Dificuldade para tomar decisões
Outra característica muito observada nas empresas familiares é a falta de governança ou uma governança incipiente que promova alinhamento entre os sócios. Nesses casos, há um sócio à frente do negócio, mas que não está suficientemente empoderado para tomar as decisões.
“A cada passo da fusão ou aquisição, há necessidade desse sócio recorrer ao núcleo familiar para que as decisões sejam efetivamente tomadas. Isso atrasa o processo, podendo até mesmo inviabilizá-lo”, diz Rodrigo Maluf, sócio-líder de M&A na EY Brasil.
Ainda segundo o executivo, o M&A para uma empresa familiar é diferente na comparação com as grandes empresas, de capital aberto, que costumam buscar essas operações por uma questão específica financeira ou estratégica – como a venda de um ativo que está dando prejuízo.
“Os negócios familiares consideram uma transação de M&A um evento estrutural, de grande relevância, que vai alterar radicalmente sua trajetória, e, frequentemente, é isso mesmo que acontece”, observa Maluf.