Sergio Paulo Gallindo: Déficit de profissionais de TI pode chegar a meio milhão até 2025. Como mitigá-lo?

O presidente executivo da Brasscom avalia soluções para esse mercado, que sofre com baixa procura de profissionais capacitados.

🎤#Entrevista | “O Brasil tem vocação para tecnologia”: Sergio Paulo  Gallindo, Brasscom | DPLNews
Sergio Paulo Gallindo, presidente executivo da Brasscom. (Foto: Divulgação)


Estudo divulgado na última quarta-afeira (1) pela Associação das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação e de Tecnologias Digitais (Brasscom) aponta que a demanda brasileira por profissionais nas áreas de software, serviços de TIC e TI In-House (que considera outros setores não identificados como tipicamente de TI) deverá alcançar 797 mil vagas em cinco anos (de 2021 a 2025), impulsionada por um investimento estimado em R$ 413,5 bilhões em tecnologias de transformação digital –especialmente em nuvem, internet das coisas e big data/ analytics. Tal projeção reflete uma aceleração significativa da demanda por profissionais do setor quando comparada ao levantamento da Brasscom divulgado em 2019, que previa 420 mil profissionais entre 2018-2024.

O efeito pandemia na dinâmica de digitalização da economia, aponta o documento, pode ser notado no saldo acumulado de empregos nessas áreas de janeiro a setembro deste ano: 123,54 mil, 2,8 vezes maior que no agregado das contratações no mesmo período, aponta a Brasscom. Esse aumento de ritmo, entretanto, também amplia o déficit de profissionais de TI já registrado no país. De acordo à associação, hoje os cursos presenciais e a distância de licenciatura, bacharelado e tecnológico em tecnologia da informação e comunicação ofertados no Brasil formam anualmente 53 mil pessoas ao ano, um terço da demanda projetada de 159 mil vagas até 2025. Nesses cinco anos, isso significará um déficit de meio milhão de profissionais.


Fonte: Brasscom, WEF, ABES, Bacen, IDC, Relatórios Financeiros de Estatais, Rais, Caged e Novo Caged.

Sergio Paulo Gallindo, presidente executivo da Brasscom, um dos caminhos para se reduzir esse déficit é aproximar outras carreiras do ensino superior do universo da TI, em particular as demais de TCEM – como a associação chama o universo STEM, sigla em inglês que se refere às carreiras em Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática. Para estudar esse potencial, a Brasscom desenvolveu uma classificação para identificar o grau de afinidade das grades curriculares de 31 cursos que vão da Física e Biologia à Estatística e Engenharia Naval, criando um ranking. “A ideia é que haja uma ‘inoculação tecnológica’ nesses cursos, em grau maior ou menor, conforme o grau de afinidade que cada um apresente”, descreve. Isso se daria através da oferta de matérias eletivas – que ensinassem, por exemplo, linguagem de programação e metodologias de desenvolvimento de software, complementando a formação desses alunos. Juntas, as carreiras em ciências, engenharia e matemática formam cerca de 184 mil alunos por ano, “que poderiam ver sua empregabilidade ampliada com essa aproximação ao mundo da TI”, diz Gallindo. E, em contrapartida, colaborar na redução do déficit de profissionais em tecnologia.

Demanda média por profissionais de softwarte,
TI In House e Serviços de 2021 a 2025 = 159 mil ao ano

Fonte: Brasscom e Inep; cálculo inclui cursos presenciais e a distância de licenciatura, bacharelado e tecnológico.

 

Cursos com maior afinidade com TI
(índice de 0 a 5, onde 5 revela a maior proximidade com TI)


Fonte: Brasscom.

A intenção da Brasscom não é entrar como operadora da iniciativa – batizada de Estratégia ∑TCEM, mas usar esse mapeamento para incentivar instituições de ensino de todo o país a adotá-la. “Nosso principal papel é ser farol, e estamos abertos a discutir estratégias”, diz o executivo. Ele ressalta que o desafio da educação em tecnologia é amplo, e deve ser tratado em várias frentes e etapas da formação. “O ensino técnico, por exemplo, tem papel relevante e é subutilizado”, afirma, com a propriedade de quem teve como primeiro degrau de formação profissional o diploma de técnico em eletrônica em instituição federal no Rio de Janeiro e chegou, entre outros cargos, a diretor-presidente da British Telecom no Brasil. Em 2019, a Brasscom apoiou o protocolo de um plano pedagógico de formação de programadores para o ensino técnico profissionalizante. “No Brasil, esse ensino ficou atrelado à questão do hardware, de manutenção e instalação de equipamentos. Mas nada impede a formação de programador multiplataforma. Isso é possível e já foi evidenciado por esse currículo que foi protocolado no catálogo nacional de ensino profissionalizante.” Outra frente que a Brasscom pretende estudar em 2022 é a de itinerário formativo em tecnologia para o ensino médio regular. “Hoje vemos bons resultados de alunos em Olimpíadas de Matemática, de Computação, que depois descartam seguir com estudos nessa área. Buscamos identificar os fatores que leva a isso, trabalhar elementos cognitivos e projetar um itinerário que capte a atenção desses jovens”, afirma.

Sobre a elaboração de políticas públicas que visem à capacitação e requalificação de profissionais em tecnologia – tratado por Fernando de Holanda Barbosa Filho, ex-secretário-adjunto de Políticas Públicas de Emprego do Ministério da Economia, em entrevista à Conjuntura Econômica, Gallindo aponta que o desafio é ainda maior. “Temos analisado a questão da capacitação inicial – que é voltada a uma camada mais jovem. Nesse campo, é fundamental avaliar o nível de empregabilidade em cada área, para se capacitar onde há demanda. E considerar as limitações socioeconômicas que ameaçam a manutenção dessas pessoas nos cursos”, cita. “Estamos estudando como reunir as principais questões afetam essa iniciativa – demanda, qual a dose eficiente, qual tipo de apoio financeiro para reter a pessoa na capacitação. Levar isso em conta fica mais caro? Talvez seja mais caro investir em um programa que não tenha efeito garantido por não se oferecer o apoio adequado”, afirma Gallindo. “Se identificarmos um modelo escalável que abranja todos esses aspectos imbricados, o retorno do investimento vai ser maior do que se ignorarmos a questão da evasão por motivos socioeconômicos ou socioemocionais. Tudo tem que estar conectado.”


Fonte: FGV IBRE