Rafael Schur: Bancos começam a adotar novo modelo de gestão de riscos e oportunidades sociais, ambientais e climáticos

Desde julho de 2022, o novo arcabouço regulatório social, ambiental e climático do BC passou a ser obrigatório para instituições financeiras, com calendário de implementação obedecendo a datas específicas por porte de instituição e instrumento normativo, de acordo com normativas publicadas pela autarquia federal em setembro de 2021.

ey-rafael-schurRafael Schur, líder do segmento de mercado de serviços financeiros da EY Brasil. (Foto: Agência EY)

Com as novas normas emitidas pelo Banco Central, os bancos começam a desenvolver bases de dados e metodologias para identificar e avaliar os riscos e oportunidades sociais, ambientais e climáticos de forma mais padronizada. A construção dessas bases referentes aos seus clientes para que sejam utilizadas na gestão de risco das carteiras de crédito é um dos elementos que permitirá avaliação mais assertiva no futuro. Desde julho de 2022, o novo arcabouço regulatório social, ambiental e climático do BC passou a ser obrigatório para instituições financeiras, com calendário de implementação obedecendo a datas específicas por porte de instituição e instrumento normativo, de acordo com normativas publicadas pela autarquia federal em setembro de 2021.

“Em um contexto global, e não apenas brasileiro, a maior dificuldade hoje é encontrar informações sobre os clientes e garantir que as metodologias utilizadas produzam resultados comparáveis entre as instituições financeiras para a exposição aos riscos sociais, ambientais e climáticos”, diz Rafael Schur, líder do segmento de mercado de serviços financeiros da EY Brasil. “Isso porque os instrumentos das instituições financeiras e os processos que elas devem seguir não foram construídos para essa realidade. Estão sendo redesenhados com base na agenda ESG, que não fazia parte do processo decisório em um passado recente”, completa.

Sustainable Finance Index (SFI), produzido pela EY, constatou que, em todo o mundo, há falta de dados precisos e de qualidade sobre os parâmetros ambientais, pois não são relatados de forma consistente e as metodologias ainda estão em evolução. Ainda segundo esse índice, as instituições financeiras europeias apresentaram o melhor desempenho, com pontuações mais altas de ESG e maiores taxas de divulgação ambiental. A taxa média dessas instituições foi de 84% - em comparação com a de 58% das norte-americanas. Em grande parte, isso é atribuído à atuação dos reguladores europeus que aprovaram número maior de regulamentações dedicadas à transparência dessas informações, como a Corporate Sustainability Reporting Directive (CSRD). A taxa média de divulgação ESG das maiores instituições financeiras brasileiras analisadas é de 82% e deve melhorar com as novas regras que entraram em vigor.

Os riscos sociais, ambientais e climáticos são uma variável nova que está sendo incorporada pelos bancos ao seu processo de análise de risco de crédito. Isso ocorre em escala global. Os reguladores brasileiros (BC e Susep – Superintendência de Seguros Privados) também estão seguindo boas práticas e incorporando requisitos climáticos além das demandas sociais e ambientais. O desafio tanto aqui no Brasil como em outros países é obter dados de qualidade inseridos nesse contexto sobre as operações dos clientes, incluindo seus setores econômicos de atuação.

“No momento, não há, por exemplo, uma base de dados no setor financeiro que relacione inadimplência do cliente com eventos sociais, ambientais e climáticos”, diz Rui Cabral, sócio de Financial Services Risk Management da EY Brasil. “Operações com mais ou menos riscos sociais, ambientais e climáticos trazem naturalmente impacto em termos de riscos operacionais, de crédito, de mercado e de liquidez. O foco das instituições financeiras, estimulado pelo Banco Central, é ter essas informações para, em um segundo momento, auxiliar seus clientes na transição para uma economia de baixo carbono”, observa.

Papel do Banco Central

As normativas do Banco Central relacionadas à agenda ESG, que foram publicadas em 2021, tratam do gerenciamento de riscos e oportunidades sociais, ambientais e climáticos por parte dos bancos e estabelecem regras para reporte dessas questões.

“Um dos objetivos dessas regulamentações é fazer com que os bancos aprimorem sua gestão de riscos sociais, ambientais e climáticos, criando condições para que eles possam gerir seu portfólio, calibrar seu apetite ao risco e aproveitar oportunidades relacionadas a uma economia mais sustentável a partir do conhecimento do perfil de risco de seus clientes, apoiando-os na transição para uma economia de baixo carbono. Mas isso só será possível depois de formada uma base robusta de informações sobre riscos sociais, ambientais e climáticos”, analisa Fernando Siedschlag, especialista ESG da EY Brasil. “O Banco Central objetiva estabilidade financeira, e os riscos sociais, ambientais e climáticos impõem dificuldade para essa agenda. Sendo assim, o BC criou uma regulamentação específica sobre ESG, com mecanismos de controle, para que as instituições financeiras estejam atentas a essa agenda, provocando por consequência o mesmo comportamento nos seus clientes. Com o tempo, passará a existir visibilidade sobre essas questões ESG na engrenagem regulatória”, finaliza.

Há dois relatórios que precisam ser formulados pelos bancos. O DRSAC (Documento de Riscos Social, Ambiental e Climático) é uma remessa de informações relativas à exposição a riscos sociais, ambientais e climáticos. Deve ser enviado semestralmente ao BC. “É nesse relatório que as informações dos clientes são analisadas, e a exposição aos riscos socioambientais e climáticos dos bancos é apresentada, considerando clientes, setores econômicos e operações que estão dentro do escopo de avaliação de risco de cada instituição”, diz Diego Pereira, sócio de Financial Accounting Advisory Services da EY Brasil. Além dos financiamentos por operações de crédito bancário, precisam ser consideradas as exposições em títulos e valores mobiliários. O DRSAC entrou em vigor em julho de 2022, e o envio das informações ao BC começará em 2023, obedecendo ao cronograma específico por porte de instituição.  

Já o GRSAC (Relatório de Riscos e Oportunidades Sociais, Ambientais e Climáticas) é um documento público de periodicidade anual que traz os riscos e oportunidades sociais, ambientais e climáticos, descrevendo a forma como a instituição financeira faz a gestão deles em termos de governança, estratégia, processos e indicadores qualitativos e quantitativos, com a complexidade do relatório aumentando de acordo com o porte de cada instituição. O GRSAC entrou em vigor em dezembro de 2022 e deverá ser publicado em 2023, com prazo máximo de 180 dias da data base de dezembro 2022, independentemente do porte da instituição.